Londres. 5:29 da manhã. Fazia 2°C lá fora. Acordei ouvindo uns gritos, levemente despertei do sono tentando entender o que os gritos diziam.
⁃ JÚNIOOOR! VOLTA AQUI, JÚNIOR! PELO AMOR DE DEUS! VOLTA AQUI, NÃO NÃO, PELO AMOR DE DEUS! NÃO FAZ ISSO COMIGO!
Gritou a donzela Brasileira. Identifiquei a voz, língua e a mensagem, pensei que fosse apenas farra de jovens, voltei a dormir. (Minto: tentei pegar no sono de novo.)
⁃ JUNIOOOR!! PÁRA! NÃO! PÁRA! PELO AMOR DE DEUS PARA COM ISSO!
O “pelo amor de Deus” sendo usado repetidamente me despertou, e o “Para com isso” me deu uma injeção de curiosidade fora do normal. Mais que o próprio nome, Júnior, qual já havia facilmente memorizado. Desconfiei que ela estivesse em apuros.
Então levantei os cobertores, aqui tem feito muito frio. Com dificuldade, fui levantando os cobertores. Digo com dificuldade por conta do aconchego maravilhoso da cama quentinha e segundo, porque minha gatinha (que por sinal está uma bola de gorda) dormia em cima dos meus pés.
Acabei pensando rápido: “Talvez a moça está em perigo!” Dei um pulo, senti o chão gelado e abri a cortina:
E lá estava ela: A donzela da madrugada gritante, de vestido preto de mangas compridas e brilhantes, sem sapatos, sem blusa. Calambeava correndo (tentando correr) atrás do tal do Júnior que, por sinal, também se sentia num país tropical: camiseta curta branca, jeans e tênis.
Ela corria atrás dele. Ele corria dela. Na mesma dinâmica entre gatos e ratos. Ela, a donzela felina, da madrugada animal. E Ele, o ratinho perfeito.
Até que nessas condições cambaleantes, sob álcool e muita disposição olímpica a correr, ela tomba no chão. E ele, flexível e companheiro, ao vê-la chorar de rir, volta e senta ao seu lado.
Se entreolham. E, por algum motivo nesse fantástico universo feminino, (que apenas nós mulheres entendemos) toda a tensão da donzela é manifestada através de tapas. Pobre Júnior.
Muitos tapas. Leves tapas; as mãozinhas em movimento muito nos ensinava sobre a parceria da cachaça com o amor e raiva.
Ri em silêncio.
Ele cruza os braços, malhados por sinal, encolhe-se num segundo protegendo-se dos ataques da donzela indomável. Agora quem grita por socorro é ele.
Eventualmente, a donzela indomável cansa. Se entreolham novamente, já sentindo o despertar da raiva e paixão que pairava sobre eles. Então se abraçam. E se beijam.
Como numa peça de teatro Shakespeariana, The Taming of the Shrew – A Megera Domada – escrita em 1596 – assim terminou a minha noite de sono.
A coisa boa é que, há um mês atrás assisti a peça no Barbican Centre, aqui em Londres, pelo Royal Shakespeare Company. Já nessa madrugada, pude recapitular alguns pontos (que já havia esquecido) de forma totalmente gratuita e com uma dinâmica naturalmente fantástica.
A vida como ela é! ❤️ 😂 🐭 🐈
Ótima semana a todos!